terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A Indústria Cultural e o amor.



A Industria Cultural, apresentada por Adorno e Horkheimer, representa a força midiática em relação ao meios de comunicação e o poder de influência sobre a sociedade. O termo aparece em um capítulo específico do livro Dialética do Esclarecimento, escrito por ambos em 1947. É uma análise da cultura dentro do sistema capitalista, em suas vertentes comerciais. O termo serve para designar o modo como a cultura se torna mercadoria pelos meios de mídia. Além disso, a forma como estes meios influenciam as massas é cultivado em seus ideais.
Não estamos falando aqui dos meios de comunicação em si, como a televisão, os jornais ou o rádio, mas do modo como estes meios são utilizados pela classe dominante para o controle social. Nossa abordagem, porém, é voltada a alguns dos produtos da Indústria Cultural, que como num ciclo, transforma tudo em produto. O âmago mercadológico da produção de cultura pelos meios midiáticos faz com que haja uma formação de pensamento de forma alienada, pois isso garante a falta de consciência do público, e o domínio do sistema imposto. Além disso, todas as abordagens da Indústria Cultural a qualquer assunto são superficiais, pois não há real interesse em transmitir uma mensagem por inteiro, caso esta não sirva para gerar o lucro. A única e mais utilizada visão é a de garantia de reprodução das condições de produção. O sujeito alienado não toma parte no todo, portanto não luta a favor de seus interesses, e se mantém dependente da Indústria Cultural, garantindo sua subsistência.
Da mesma forma que a cultura em geral é tratada como produto pela Indústria Cultural, a abordagem mais específica de determinados temas também é banal, visando apenas o lucro. O amor, portanto, é tratado como mercadoria, em produções quase sempre igualitárias e clichês. Como foi dito mais acima, por Schopenhauer, as tramas que possuem âmago amoroso são muito mais rentáveis, pois o interesse humano no assunto é intrínseco e latente. Trabalhar com o amor, portanto, gera lucro inestimável à Indústria Cultural.
O amor está nas novelas, nos filmes, nos comerciais, nas campanhas publicitárias, até mesmo nos jornais. Tudo o que traz amor, vende.
Para o professor e jornalista Rovilson Robbi Britto, nós temos uma dupla realidade social. Uma que é a do cotidiano, e outra, que é a realidade midiática. A Indústria Cultural procura então transformar os valores morais, o amor, a solidariedade, em valores mercantis. Isso atua junto à realidade cotidiana, mas não consegue alterar o que é natural do ser humano. Então, existe mesmo a banalização, porém não é de grande impacto aos valores sociais. A Indústria Cultural, para ele, cria sim padrões, mas não é algo seja a primeira a fazer. Ela estabelece padrões estéticos, morais, de relação, mas isso também se confronta com a realidade das pessoas em geral. Há uma parcela social que tem uma visão mais crítica, o que impede que haja uma totalidade de propostas de padrão vencedoras. Não existe uma regra. O ideal é o que é possível, por mais que a Indústria Cultural busque uma diferenciação comercial. É algo humano demais para ser controlado. O amor sempre deu as costas para qualquer impedimento social, moral ou ético, quando precisou. Não podemos, portanto, atribuir toda a culpa à Indústria Cultural.
A Indústria Cultural trabalha com o amor porque vivemos em uma sociedade de carentes, e ela dialoga com isso. É uma carência universal. Definir o amor em categorias opostas, como o “amor verdadeiro” e o “amor comercial” é perigoso, pois o amor rentável também não é uma exclusividade da Indústria Cultural. Fora dela, também existe a possibilidade da banalização, e pode acontecer de a Indústria Cultural trazer formas de amor verdadeiro. A carência social fragiliza o público, e a Indústria Cultural se aproveita desta fragilidade, para manipular, introduzir ideais. Então, o que é preocupante é como a Indústria Cultural consegue dialogar com esta carência. A porta de entrada para o público é a sua carência. Ela se apropria disso para manter o controle e garantir a rentabilidade.
Existe um reflexo social, a influência é realmente muito grande. Mas não podemos considera-la única. O que existe é uma proposta de banalização e padronização. Encontraremos o amor banal produzido pela Indústria Cultural, mas vamos encontrar também, talvez com um pouco mais de dificuldades, amores que entrem em contraponto. A Indústria Cultural até tenta “matar” o amor, mas a realidade é conflitante, o sentimento é natural ao homem.
O motivo destas tentativas de banalização, não só do amor, mas de todo tema tratado na Indústria Cultural é que para ela o fundamental é banalizar e se apropriar da característica do sentimento. Assim, ao invés de a pessoa estar com o amor, ela estará com a Indústria Cultural. Ao invés de amar alguém, a pessoa estará assistindo e vivenciando o amor da telenovela. Quando as pessoas têm alguma relação que foge a isso, de certa forma diminuem a capacidade de influência da Indústria Cultural.
A Indústria Cultural trabalha com duas formas de amor: uma é o amor impossível, a outra é o amor descartável. Ambas tendem a encaminhar à frustração, e isso é que garante sua estabilidade de manipulação.
O debate é instigante, mas não deveríamos olhar apenas com preconceito. A Indústria Cultural também se abre para aquilo que circula em sentimentos. Existe uma carga de banalização enorme, mas também acaba trazendo amores que estão na sociedade e são reais. A Indústria Cultural trata do amor de forma banal em sua maior parte, mas também traz o amor verdadeiro em determinados produtos. Não devemos nos negar em totem àquilo que é feito pela Indústria Cultural. Filmes como “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, “A Fraternidade Vermelha” e “A Insustentável Leveza do Ser” mostram uma visão do amor que é instigante, provando que a Indústria Cultural pode trazer produtos culturais, ainda que mercadológicos, muito bons.
Não podemos transformar a parte no todo. Existem as mediações, formalizamos nossas visões. É preciso ter uma visão crítica sobre a Indústria Cultural, assim como é preciso ter uma visão crítica sobre a sociedade.