quinta-feira, 25 de março de 2010

Verborrágico

Antes de tirar os óculos escuros, olho pelo vidro do carro. Ajeito a camisa, me desviando dos adevisos de "REPORTAGEM". Vaccari, o melhor fotógrafo, que pode montar comigo a melhor equipe (desde que Edson seja nosso motorista), ajeita as lentes nos bolsos do colete.
- Sucesso total? - pergunta, com seu jeito descontraído.
- Sucesso total - confirmo, com um riso manchado.
Não importa quantos sóis enfrentemos. Ou chuvas pelas canelas. Nos rádios walk-talks, nos divertindo nas ondas curtas, ou "analisando" possíveis entrevistadas, para depois confirmar em sérias entrevistas. De certa forma, sempre estaremos ligados à paixão pela profissão escolhida. Ainda que a pauta caia.
Ora. Desde que me transformei em um repórter atrás dos desastres sociais em minha pequena e provinciana cidade dentro da capital da maior metrópole da América Latina, não me expus ao verdadeiro ridículo de me retirar em palavras que por muitas vezes se encontram poeticamente disformes. Entreguei tais esperanças ao Gabo, enquanto me afundava em novas conspirações, lutando batalhas há muito perdidas.
Gabo, me ajude. Venha me tirar do peito a ilusão de amores tão desentendidos!
De vez em quando resolvo dar entrevistas longuíssimas a tablóides universitários, loucos por uma revelação bombástica do rockstar que nunca fui.
E nem me revoltei.
Estive em Macondo, em Bogotá, Nova Jersey e Nova York. Agora passeio pelas ruelas cruas da África do Sul, entre fotógrafos consagrados por imagens chocantes.
Até tentei descansar em becos curtos, mas fui arrastado pela enchente que carregou de tudo: móveis, lixo e corações.
Antes de tudo, reencontrei emoções que estavam engavetadas, acumulando poeira. Elas me levaram pela mão: caminhamos juntos em ruas enlameadas, procurando uma piscina para relaxar. E com risos.